Maurício Tuffani
Do portal Direto da Ciência

 

O Conselho de Competitividade da União Europeia aprovou, dia 27 de maio, a diretriz de que todos os artigos científicos produzidos por instituições públicas europeias e também os custeados com recursos públicos deverão, até 2020, adotar o modelo Open Access (OA), no qual não há cobrança pelo acesso aos conteúdos de periódicos acadêmicos.

Aprovada por ministros das áreas de ciência, tecnologia, educação, indústria e comércio dos 28 países-membros, a orientação ainda não tem força de lei, mas há forte pressão de alguns governos nesse sentido, informou o jornalista holandês Martin Enserink, em sua reportagem “In dramatic statement, European leaders call for ‘immediate’ open access to all scientific papers by 2020” na revista Science.

Principais articuladores

Entre os principais articuladores da diretriz OA para a publicação da produção científica europeia estão o português Carlos Moedas, responsável pelo Programa-Quadro de Pesquisa e Inovação da União Europeia, e o presidente do Conselho de Competitividade da entidade, Sander Dekker, ministro da Educação, Ciência e Tecnologia da Holanda.

Por meio de um press release divulgado pelo Conselho, Dekker afirmou: “A pesquisa e a inovação fornecem as soluções para os desafios sociais e econômicos do futuro. (…) O Open Access derruba os muros em torno da ciência e assegura para a sociedade os benefícios possíveis a partir das descobertas científicas. Dessa forma, nós maximizamos o impacto das universidades e das instituições de conhecimento”.

Principais opositores

No entanto, também é da Holanda o conglomerado empresarial que certamente fará grande oposição a essa diretriz, o grupo editorial Elsevier, que edita periódicos como o consagrado The Lancet e tem a maior fatia do bilionário negócio internacional de publicações acadêmicas. Em 2012, o conglomerado holandês chegou a sofrer um boicote internacional de pesquisadores por cobrar taxas de valores superiores a mil dólares para editar artigos e ao mesmo tempo cobrar pelo acesso aos seus conteúdos. Nesse mercado, o Elsevier é seguido de perto pelo Springer-Nature, resultado da fusão no ano passado entre o alemão Springer e o britânico Macmillan, que edita revistas como a prestigiada Nature.

‘Definição’ de OA

As opiniões desses grupos sobre o assunto ainda não foram ouvidas. Exceto por poucos jornais, como o britânico The Guardian, que praticamente reescreveu o conteúdo da reportagem da Science, a imprensa internacional ainda não repercutiu a notícia, apesar do press release, que divulgou também a definição do Conselho de Competitividade da UE para o Open Access.

Acesso aberto significa que as publicações científicas sobre resultados de pesquisas apoiadas por fundos públicos e público-privados devem ser livremente acessíveis a todos. Isso ainda não acontece. Os resultados da investigação financiada por fundos públicos não estão acessíveis a pessoas de fora das universidades e das instituições de conhecimento. Como resultado, professores, médicos e empresários não têm acesso às mais recentes descobertas científicas que são tão relevantes para o seu trabalho, e as universidades têm de negociar assinaturas de alto custo com as editoras para ter acesso às publicações.

Crescimento do OA

Na verdade, tanto o grupo editorial Elsevier quanto o Springer-Nature também têm publicações em acesso aberto na internet. Recentemente, Heather Morrison, professora da Escola de Estudos da Informação da Universidade de Ottawa, no Canadá, divulgou em seu blog que o conglomerado holandês é o de maior número de periódicos Open Access, ao todo 511, seguido pelo alemão De Gruyter, com 435, e pelo egípcio Hindawi, que também tem sedes em Londres e Nova York, com 405 títulos. No entanto, o Springer Nature teria aproximadamente 500 revistas em acesso aberto, número correspondente à soma de cerca de 160 títulos do Springer Open, 290 do BioMed Central e 47 do Nature Publishing.

Periódicos predatórios

O grupo Hindawi e suas publicações, no entanto, são assunto frequente do blog Scholarly Open Acces, do biblioteconomista Jeffrey Beall, professor da Universidade do Colorado em Denver. Sua lista de publishers predatórios relaciona editores que exploram o modelo de acesso aberto para publicar os chamados periódicos predatórios — aqueles cujo fator decisivo para publicar artigos não é sua aprovação após um processo de revisão por especialistas, mas o pagamento de uma taxa.

Proliferação negativa

Espera-se que a União Europeia adote para sua diretriz salvaguardas que evitem como efeito colateral o impulsionamento da proliferação desenfreada dos periódicos predatórios. Em outubro de 2015, um estudo na revista BMC Medicine — publicada pelo BioMed Central, do grupo Springer-Nature — mostrou que cresceu de cerca de 53 mil em 2010 para 420 mil em 2014 o número de artigos dos periódicos publicados por publishers predatórios. Ou seja, um volume que se tornou sete vezes maior em quatro anos.

Predatórios no Brasil

Aqui no Brasil mais de 200 periódicos predatórios foram classificados na plataforma online Qualis Periódicos, na avaliação trienal 2010-2012, como já mostrou este blogueiro em seu blog anterior na Folha de S.Paulo.