Luís Osvaldo Grossmann
Do site Convergência Digital

O governo começa a estruturar um novo projeto para garantir conexões à internet às escolas públicas do país, sete anos depois do acordo que resultou no Programa Banda Larga nas Escolas. Para isso, reuniu nesta segunda, 15/6, duas dezenas de diferentes ‘especialistas’ do governo, de empresas, institutos de pesquisa e interessados. Como foi um primeiro encontro, não houve, e nem seria possível, conclusões além de que a conectividade atual é ruim.

A iniciativa é da Secretaria de Assuntos Estratégicos e faz parte da missão de colocar de pé um programa que atenda ao lema do segundo mandato de Dilma Rousseff: Pátria Educadora. Mas se o primeiro passo da SAE arrepiou educadores, por propor soluções sem atentar para o acúmulo de debates e a existência de um Plano Nacional de Educação, o ministro Mangabeira Unger e sua equipe se mostraram bastante dispostos a conhecer o que existe de legado sobre a conectividade das instituições de ensino.

A parte mais conhecida desse legado é o Banda Larga nas Escolas, acerto costurado entre 2007 e 2008 e que resultou na troca de obrigações de universalização assumidas pelas concessionárias de telefonia. Ele prevê acesso à internet nas (então) quase 60 mil escolas públicas urbanas do país – hoje são mais de 65 mil. Mas a velocidade de conexão é baixa para o uso coletivo: até 2 Mbps. “Na época, 2 Mbps era razoável. Em 2015, está subdimensionado”, admitiu o diretor do Sinditelebrasil, o sindicato nacional das teles, Carlos Duprat.

Até por isso, a SAE descreve um programa que indique metas nacionais, notadamente de velocidades de conexão, ainda que elas respeitem variáveis de infraestrutura existente, prioridade e capacidade de execução local – inevitáveis em um país de contrastes como o Brasil. Mais relevante parece ser o governo tratar o acesso à internet como inerente à desejada ‘pátria educadora’. “A conectividade da rede pública, com velocidade significativa, é preliminar decisiva para que a gente avance com uso de novas tecnologias e acelere a realização dos demais eixos do projeto geral de qualificação do ensino básico”, resumiu o subsecretário de ações estratégicas da SAE, Daniel Vargas.

Mas ficou evidenciado o grande desconhecimento do governo federal sobre o que existe fora de sua seara. O secretário de Educação do Amazonas, Rossieli Soares da Silva, revelou, por exemplo, que todas as escolas de Manaus contam com redes de fibras ópticas. “No mapeamento apresentado pelas teles, duvido que tenha o que estados e municípios investiram. Nem é discutido”, lamentou. O caso do Amazonas não é único. O consultor da Fundação Lemann, Diogo Moyses, emendou: “Chama atenção nos estudos a duplicidade de esforços. Quase todos os estados têm algum tipo de investimento. Às vezes chega-se ao ponto de ter duas ‘caixinhas’ na mesma sala de aula.”

Tal desconhecimento não é de surpreender diante da revelação de que a fiscalização de seu próprio programa de conectividade escolar foi abandonada. “No Ministério da Educação, a equipe que fazia acompanhamento do Banda Larga nas Escolas foi totalmente descontinuada”, disse Cesar Rômulo, também do Sinditelebrasil. Assim, o que se tem hoje são apenas os dados que as próprias empresas fornecem – ainda que em diferentes casos as escolas prefiram buscar outros provedores.

Com ou sem fibra

Mas se há razoável consenso sobre o diagnóstico, a resposta dividiu os presentes em um ponto em especial: a necessidade, ou não, de que as escolas do país sejam contempladas com redes de fibras ópticas. Para a banda ‘telecom’ da mesa, não é o caso. “Achar que todas as escolas do Brasil precisam ter fibra é descabido. Se partirmos dessa premissa, fica difícil um projeto parar de pé. Algumas escolas têm dificuldade até de energia elétrica”, disparou o superintendente de Planeamento e Regulamentação da agência, José Alexandre Bicalho.

O contraponto, pela ala ‘educacional’ da reunião, veio do diretor-geral da Rede Nacional de Ensino e Pesquisa, RNP, Nelson Simões. “Estamos pensando em educação. Se dimensionar pela necessidade de hoje e quiser evoluir, pensar em cinco anos já errou. Querer adequar o uso ao possível sufoca o próprio uso. O que deve presidir a escolha é o planejamento em longo prazo da incorporação da tecnologia na educação, e aí vamos chegar a várias conclusões, inclusive onde é fibra no primeiro momento, onde chega depois.”

Mas para as teles, esse é um esforço “de dezenas de bilhões de reais para cima”, motivo de a banda de telecom voltar a falar do uso do Fust, o fundo de universalização das telecomunicações, e do esforço para a redução do ICMS sobre os serviços. Eis um ponto de pura retórica em um encontro sem convidados da área econômica do governo. E no campo do ICMS, os secretários de educação presentes frisaram que reduzi-lo tem impacto direto no Fundeb – o fundo da educação básica – retroalimentando o dilema do financiamento.

Não por menos, veio do ex-presidente da Etice, a empresa de TI do Ceará, Fernando Carvalho, a contribuição menos teórica nesse campo: repetir em nível federal o que aquele estado fez com seu ‘cinturão digital’ – uma rede de 2,3 mil km de fibras que atende mais de 50 cidades. A lógica adotada foi de que a demanda pública estaria atendida com uma parte da rede, com o resto sendo ‘monetizado’. “Dentro do cabo tem vários pares, 36 deles, e eu só preciso de um par. Há de se segmentar de forma a se pagar o custeio pelo aluguel desse cabo, concedendo para a iniciativa privada explorar”, defendeu.

No conjunto, essa primeira reunião da SAE foi uma provocação inicial e um pedido de sugestões e informações para um próximo debate em 15 dias. Ficou clara a necessidade de que sejam mapeadas experiências e infraestruturas existentes, seus alcances e limitações. Também faltam análises aprofundadas de como dimensionar escalas de atendimento – qual a taxa de transmissão mais adequada para determinado número de alunos, por exemplo – e como ampliar as velocidades com as redes atuais. E, não menos importante, qual regime de governança a ser adotado, visto que não houve entendimento se um programa desses deveria ser gerido pelo Ministério da Educação ou das Comunicações.