Acreditamos em um tipo de inovação que torne a educação mais humana, mais divertida e criativa, e mais instigante, na qual educadores e estudantes se desenvolvam a cada dia em processos de trocas interpessoais. Além de uma boa dose de ousadia, a escuta e a co-criação são, para nós, fatores indissociáveis da inovação. Sem eles, inovar não fará sentido. Por isso, nos unimos à iniciativa de outros colunistas de criar oportunidades de escuta atenta dos estudantes secundaristas que participam dos movimentos de ocupação de escolas. Publicamos aqui o texto de Milena Fernanda, aluna da E.E. Prefeito Mario Avessani, na cidade de Santa Cruz das Palmeiras, no interior de São Paulo enviado para nós gentilmente, via WhatsApp.

 

Juventude de luta!

Por Milena Fernanda

Nossa luta começou com manifestações e idas à diretoria regional de ensino, mas, como sempre, o estado autoritário nem sequer quis nos ouvir. Esperavam que iríamos apenas aceitar assistir a desorganização escolar acontecendo. Foi aí que o estado e a sociedade puderam ver que existe uma juventude de luta, que aprendeu filosofia, e agora ensina o exercício da cidadania a um estado opressor e despreparado que recebe seus alunos com bombas e cacetetes.

Aqui no interior não apanhamos da polícia, mas sofremos pressão por parte da dirigente, da supervisora, do diretor (que perdeu o cargo) e do judiciário, pois cinco meninas estão sendo processadas pelo estado, e pressão de pessoas que não sabiam o que estava acontecendo e nem ao menos tinham filhos em escolas públicas.

Ocupar foi nossa última opção e foi o que deu certo. A experiência de conviver com outros alunos, de organizar uma rotina, ensinar vários assuntos de sala de aula, esquematizar tarefas como cozinhar e limpar nos mostrou quão capazes somos de lutar por um ideal.

Acompanhamos a luta em São Paulo viajando sempre que podemos sem perder o foco aqui no interior, buscando sempre a unificação do movimento.
Diferente da secretaria de educação, nós estudantes ouvimos vários pais e alunos em assembleias. Afinal, não precisa ter doutorado para entender que fechar escolas nunca será a melhor solução a ser tomada.

Continuamos em luta, pois não é apenas a suspensão que queremos, e sim a revogação; queremos que esse “projeto” seja extinto de uma vez por todas.
Manter uma escola em bairro periférico, como é o nosso caso, é de extrema importância; imagine quantos jovens se afastam das drogas e do envolvimento com outras práticas criminosas por estar participando de ações pedagógicas em suas escolas. Quantos pais se sentem seguros em saber que seus filhos não estão tendo que passar por pontos perigosos ao ir à escola, que não estão tendo que percorrer longas distâncias para estudar.

O problema causado pela reorganização vai além das distâncias, é cultural, é social! É impactar de maneira infeliz a vida de pais e estudantes.
Por isso é necessário o apoio de toda a sociedade para derrubarmos tal projeto que tem fundamentos falhos, que visa apenas a economia nos cofres públicos, a privatização e a municipalização; e para melhorarmos o ensino público.

Vamos para as ruas juntos, pois esse é só o começo de uma revolução na educação do Estado de São Paulo.
A escola em que estudo se localiza em um bairro afastado do centro da cidade, constituído por classe trabalhadora e estamos correndo o risco de perder o ensino médio que os alunos e professores tanto lutaram para conseguir em 2005. Provando a postura autoritária do estado, não houve nenhum preparo, estudo ou aviso de que minha escola passaria pela reorganização; apenas, em uma tarde comum, o ex-diretor da escola anunciou de forma informal a inclusão da escola nessa baderna educacional.

Fato que causou revolta na maioria dos estudantes e pais e, a partir daí, começaram as manifestações nas ruas da pequena cidade de Santa Cruz das Palmeiras, no interior de São Paulo.

A ocupação foi o resultado radical desse período de manifestações, passeatas e idas à diretoria regional de ensino. Uma vez, nós nos deslocamos até a diretoria regional que fica em uma cidade vizinha para falar com a senhora dirigente, mas sequer fomos atendidos. Ficamos durante horas protestando com cartazes e cantorias na porta do prédio mas não fomos atendidos – a mesma alegou que estava em reunião e não teria 30 minutos para conversar com alunos, os quais deveriam ser sua prioridade em um momento tão crítico.

No dia 16 de novembro ocupamos a escola, colocamos nossos próprios cadeados e penduramos nossas faixas e bandeiras. A mídia logo chegou e com ela o ex-diretor e o pessoal da Diretoria de Ensino. Após ameaças e tensão, chegou a primeira noite e assim começava nossa ocupação. Nós nos viramos com a comida que recebíamos e tínhamos um esquema de organização para cozinhar, para limpar, dormir e estudar lá dentro. Realizamos reuniões com os pais, assembleias com os alunos e oficinas também, como a permacultura.

A pressão feita por parte da diretoria de ensino foi nosso maior inimigo, pelo menos aqui no interior, onde conseguiram colocar o judiciário contra nós.
Como consequência, cinco meninas estão sendo processadas (inclusive eu), e precisamos nos defender agora… O cúmulo é o estado processar menores de idade. Isso ilustra o que estamos vivendo no lindo, perfeito e rico estado de São Paulo.

A ocupação revolucionou a vida não só dos estudantes que ocuparam, mas também a vida dos pais, dos professores e principalmente a pacata vida dos moradores tradicionais desta cidade, que puderam perceber que esta geração não é apenas bagunça, irresponsabilidade e baladas, mas, sim, uma juventude de força, luta e cidadania.

 

 

Este mês, o espaço desta coluna foi cedido pelas autoras Marcia Padilha e Adriana Martinelli.

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