Jan Vašek-jeshoots.comMilhões de crianças e jovens passam horas sentadas em uma cadeira, ouvindo (ou não) seus professores. Milhares de professores passam horas em pé, gastando as cordas diante de crianças sentadas em cadeiras que estão ouvindo (ou não) o que está sendo dito. Essa é uma cena clássico em grande parte das escolas do país. Mas, felizmente!, existe a pequena parte… e cada dia maior… composta por professores que estão experimentando uma nova metodologia de ensino, chamada de sala de aula invertida (flipped classroom, no termo original em inglês, mas também traduzido como sala invertida).

A “inversão” em questão tem a ver com uma mudança no formato de aula. Em vez da aula expositiva, em geral dentro de uma sala de aula, a proposta é utilizar materiais didáticos, fora da escola, para iniciar o contato do aluno com o tema. Depois disso, em classe, desenvolve-se a dinâmica de aprendizagem. Na teoria, o que acontece é que o professor sai do papel de reprodutor do conhecimento e assume a função de gestor do processo formativo.

Os materiais de apoio à aula invertida podem ser livros e apostilas. Mas, nos dias de hoje, a metodologia flipped classroom tem a ver diretamente com aproveitar as potencialidades das novas tecnologias. Por exemplo, em vez de, ou além de pedir aos alunos para lerem um livro, que tal indicar que assistam vídeos ou pesquisem assuntos na rede – o que pode ser feito de casa, no metrô?file6361336258970

“O exercício que o aluno encarava sozinho, no seu quarto, às vezes enfrentando dificuldades, agora pode ser feito em sala de aula, com a possibilidade de uma interferência imediata do professor. Inclusive com atenção personalizada”, explica Wilson Azevedo, diretor da Aquifolium Educacional, que anualmente realiza o curso online “Flip: a Sala de Aula Invertida”, com Jon Bergmann, estadunidense pioneiro nessa área.

Na internet, existem muitos vídeos, games e softwares disponíveis em plataformas abertas. Há também ferramentas para que os professores possam preparar seus próprios recursos educacionais, se preferirem. Aí é só postar num blog ou gravar em pen drive ou em DVD para ver na TV de casa – a entrevista de Wilson Azevedo para esta reportagem, por exemplo, foi gravada em podcast e enviada à repórter Marina Pita. Acesse pra ver como é um jeito legal de aprender!.

Especialista em educação e tecnologia e um dos defensores da sala de aula invertida, o professor José Moran alerta: “Não há receita de bolo para a aplicação da sala de aula invertida”. O educador, diz ele, precisa experimentar e ir fazendo ajustes de acordo com suas possibilidades e as possibilidades dos alunos.

Inverter as aulas expositivas com as atividades práticas naturalmente trará mudanças como a maior personalização do ensino. “No modelo tradicional você precisa definir o ritmo da exposição do conteúdo. Mas, quando a tira da sala de aula, o aluno trabalha no tempo dele. Assim, alguns vão avançar mais e outros vão avançar menos”, detalha Azevedo. Na forma convencional, o docente fixa o tempo da aprendizagem e o aluno aprende o que consegue naquele tempo. “Na sala de aula invertida, você pode pegar o tempo, que era fixo, e abrir. E aí você fixa o aprendizado, que precisa ser de 100%. Desse modo você capta todo o potencial da sala de aula invertida”, avalia Azevedo.

Alunos fizeram os vídeos

A experiência de Jorgelina Talei, que dá aula de espanhol na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), em Foz do Iguaçu (PR), foi muito positiva. Tudo começou no ano passado, porque os alunos pediram algum material para revisar as aulas. Jorgelina, uma corajosa experimentadora na área educacional, saiu em busca de alternativas e se interessou pelo modelo de sala de aula invertida. Para ela, era importante que os alunos participassem da construção do conhecimento, de forma que os vídeos expositivos foram, em alguns casos, gravados também por eles, com o apoio de um tablet.

“Eu enviava o programa com todos os temas do semestre. Gravava o conteúdo da gramática e postava no canal de YouTube. Os alunos tinham três dias para ver e pesquisar sobre esse tema. Geralmente eu deixava no Facebook vários links de pesquisa para orientá-los”, conta. Nas aulas, a professora trabalhava o conteúdo em forma de debate, dividindo a turma em grupos menores. “Nas aulas, deu para trabalhar melhor a oralidade e também a capacidade crítica dos alunos”, diz Jorgelina. Confira, abaixo, um vídeo das aulas de espanhol de Jorgelina.

Marco Antonio Alves Pereira utiliza vídeo aulas e o método de sala de aula invertida desde 2011. Mas pesquisa o assunto desde 2009. O professor utiliza a metodologia para lecionar a disciplina Sistemas Operacionais, do curso Análise e Desenvolvimento de Sistemas da Faculdade de Tecnologia (Fatec) de Taquaritinga, mantido pelo Centro Paula Souza. São oito turmas, aproximadamente 400 alunos. Ele usa a plataforma Virtual Education, que tem, para esta disciplina, vinte vídeo- aulas. Mas ele também sugere aos alunos vídeos complementares, no YouTube.

Pereira reconhece que preparar material para sala de aula invertida dá muito trabalho no começo. Mas, depois, é mais uma questão de atualização: “A produção de uma disciplina online demanda bastante dedicação. Porém, depois de pronta, o professor precisa apenas manter o conteúdo atualizado. Ou seja, têm-se uma carga de trabalho grande no princípio, que depois diminui bastante”.

O esforço vale a pena, segundo Pereira. Em um estudo comparativo realizado em 2011 e 2012, Pereira já registrou melhores índices de aprovação no semestre em que houve aulas invertidas (Veja a tabela completa abaixo). Os alunos gostam principalmente do fato de as vídeo aulas estarem sempre à mão. “Quantitativamente falando, houve um aumento do índice de aprovação em minhas disciplinas. Do ponto de vista qualitativo, pude perceber mais engajamento dos alunos em seu próprio aprendizado. Eles demonstram satisfação ao resolver os exercícios propostos em sala de aula, em equipes”.

De quebra, as experiências mostram que a metodologia de sala de aula invertida aumenta o protagonismo do estudante porque ele define o tempo que precisa para aprender. “É um aluno mais autônomo porque a escola dá espaço para ele seguir no seu ritmo e isso se reflete em uma postura diferente”, avalia Azevedo.

 

Comparativo de desempenho acadêmico feito pelo professor
Marco Antonio Alves Pereira, da Fatec Taquaritinga

   Aula tradicional
Aula invertida
1 sem/2011 % 2 sem/2011 % 1 sem/2012 % 2 sem/2012 %
SO-I tarde Alunos 43 100 42 100 37 100 35 100
SO-I tarde Aprovados 26 76,5 34 81 22 59,5 31 88,6
SO-I tarde Reprovados 8 23,5 8 19 15 40,5 4 11,4
          
SO-I noite Alunos 48 100 38 100 38 100 32 100
SO-I noite Aprovados 27 56,3 27 71,1 25 65,8 23 71,9
SO-I noite Reprovados 21 43,8 11 28,9 13 34,2 9 28,1

 

 

Videoaula da professora Jorgelina Talei, que leciona espanhol
na Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila
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