Trabalho próprio pelo carregador - Autor: Mr. Zabej https://commons.wikimedia.org/wiki/File:3D_printer_-_%22child%22_of_hackerspace.JPG?uselang=pt-br#filelinksEm 2009 expiraram as patentes de impressoras 3D. De lá para cá, várias pequenas empresas surgiram a partir da possibilidade de usar uma impressora 3D de mesa, projetando e tornando reais objetos ou ferramentas para desenvolver produtos. Esse movimento se ampliou e proliferou por todo o mundo, em parte por conta do conceito de hardware livre. A possibilidade de qualquer pessoa poder produzir protótipos, de produtos ou de máquinas, despertou o “professor pardal” que existia dentro de muita gente.

Ganhando adeptos nos laboratórios de garagem, a chamada “cultura maker” (cultura dos fazedores, na livre tradução para o português) cresceu e apareceu. Agora, com força, na escola. Quer saber como se tornar um professor maker?

Apesar de proveniente do universo empreendedor, a cultura maker se adapta muito bem ao ambiente educacional. Por ter como base a imaginação e a experimentação, combina perfeitamente com as metodologias que visam estudantes com perfis ativos, que aprendem a partir de projetos. “É a visão de educação de Anísio Teixeira”, salienta Luca Rischbieter, educador, mestre em Educação e consultor pedagógico da Positivo Informática Tecnologia Educacional. “Construir com as próprias mãos é uma vivência inesquecível. Agora, com os muitos portais na internet, é muito mais fácil fazer projetos. Além disso, você tem uma ótima ferramenta no bolso do aluno, o celular”, diz Rischbieter.

Para Alan Barbosa, professor de ciências com habilitação em biologia, projetos “maker” geram hábitos valiosos: “O aluno que trabalha com iniciação científica e projetos científicos ao longo de sua vida acadêmica, da educação básica ao ensino superior, manterá essa conduta e usará esses procedimentos na vida profissional. Vai se tornar crítico de processos e não de pessoas. Isso faz com que ele se torne um profissional de alto rendimento, mesmo não tendo formação técnica”, argumenta Barbosa, que coordena curso de robótica na Escola Estadual Elza Facca Martins Bonilla, em São Paulo (SP).

O “fazer”, diz ele, permite que o aluno falhe, analise a falha e corrija o processo a partir da avaliação do que deu errado. “Tornam-se críticos de si mesmos e capazes de analisar o contexto total”, acrescenta.

Nos últimos quatro anos, Barbosa trabalhou com mais de uma centena de alunos nos seus cursos de robótica. Atualmente, a equipe é composta por 40 jovens – 30 do ensino fundamental e dez do médio. O projeto, que recebe verba do programa do governo federal Mais Educação, tem metas ambiciosas: melhorar a avaliação externa da escola em 10% (Saresp, Idesp); participar da Mostra Nacional de Robótica e da Competição Brasileira de Robótica em Uberlândia (MG); classificar uma equipe, pela segunda vez, para o Desafio de Inovação 3M e Febrace 2016; conseguir 4 medalhas de ouro no Torneio Juvenil de Robótica 2015, entre outras.

A diversidade de projetos “maker” desenvolvidos nas escolas demonstra a vitalidade do modelo, quando bem conduzido. A Escola Estadual de Ensino Médio Rui Barbosa, do município de Tucuruí (PA), por exemplo, desenvolveu um protótipo de semáforo de baixo custo com Arduino. A Escola Estadual de Ensino Médio Eneida de Moraes, de Anaindeua (PA) criou um sistema de detecção e monitoramento de vazamento de gás liquefeito de petróleo (GLP).

Esses trabalhos fazem parte do Programa de Extensão Universitária Laboratório de Engenhocas, coordenado por Wellington Fonseca, professor da Universidade Federal do Pará (UFPA), com a participação de outros docentes. Criado em 2011, o laboratório abriga cinco projetos de extensão e tem como principal objetivo incentivar a galera das escolas públicas a seguir carreira na áreas de Ciências Exatas, em especial Engenharias, Ciência e Tecnologia. Para isso, o programa capacita professores dessas escolas em estratégias de ensino baseado em projetos.

“É muito importe o uso de projetos para a aprendizagem. A idealização, a elaboração, a construção de um projeto são momentos em que o aluno materializa os conteúdos vistos em sala de aula, seja em quadro ou em um livro, fixando os conteúdos abordados”, defende Fonseca, da UFPA.

Apesar de acreditar que não há obrigatoriedade de uso de tecnologia para projetos “maker”, Fonseca entende que projetos envolvendo software e hardwares diversos são mais estimulantes: “Os garotos têm muito acesso a computadores, internet, softwares, tablets e smartphones”.

Impressoras 3D ganham espaço nas escolas

A Escola Moppe (Moderna Orientação Psico Pedagógica Escolar), de São José dos Campos (SP), adquiriu uma impressora 3D no início deste ano. Os alunos ficaram encantados com a novidade. “A grande maioria nunca tinha tido contato com uma máquina semelhante”, explica a coordenadora pedagógico Débora Alcalde. Ao iniciar a construção de uma maquete sobre o período feudal, nas aulas de História, um grupo do 7º ano decidiu fazer um castelo em 3D. “Na primeira impressão, que fizeram sozinhos, eles viram que a proporção do castelo não estava adequada à maquete. Então foram orientados pelos professores, fizeram as correções e conseguiram imprimir o castelo com o tamanho ideal”, explica Alcalde. “Foi muito bacana ver a impressora 3D utilizada como um recurso para trabalhos escolares e não como um fim em si. A proposta de enriquecer o processo da maquete e ampliar os conhecimentos dos alunos foi alcançada”, comemora a diretora Tatiana Almeida Cunha.

A experiência com impressora 3D também tem animado o curso técnico da Fundação Centro de Análise, Pesquisa e Inovação Tecnológica (Fucapi), no Amazonas. Glauco Aguiar propôs aos alunos fazer uma impressora, em vez de comprá-la de um fornecedor.

No primeiro momento, os alunos duvidaram da própria capacidade de construir uma máquina que envolve mecânica, eletrônica e programação, explica ele. A divisão de tarefas foi essencial para que eles ganhassem confiança e o projeto seguisse adiante: “Tinha setor de montagem, de testes, de produtos, financeiro e até o marketing. No setor de montagem, tínhamos um mecânico de veículos que foi a chave do sucesso”.

Foram dois meses para os alunos conseguirem uma precisão de 200 nm. “Dei autonomia aos grupos para realizarem as tarefas, mas sempre que preciso sentava com eles. Aprendemos muito assim. Fica um processo muito rico de conhecimento para ambos, o professor e o aluno”, ressalta Aguiar.

Desafios para implementar

Um dos desafios centrais para a educação é implementar a cultura maker de forma consistente. “A mudança de filosofia e postura é mais importante que a disponibilidade tecnológica. As iniciativas pontuais dão mídia, mas no dia a dia não tem muito aluno fazendo, construindo, na prática. O que tem é muita gente assistindo e aí você forma cidadãos passivos demais”, avalia Rischbieter. O educador acredita que as escolas ainda não conseguiram abrir mão de parte do conteúdo das apostilas para aproveitar as experiências práticas.

Cassia Fernandez, pesquisadora do Laboratório de Sistemas Integráveis da Universidade de São Paulo e mestranda em programação e robótica em ambiente de ensino, chama atenção para a distorção: a moda de se propor projetos de construção em ambiente escolar com professores aplicando metodologias tradicionais. “Em vez de criar o projeto estimulando a autonomia dos alunos, entregam manuais de como fazer. Isso é desvirtuar o processo”, lamenta Fernandez.

O grande potencial de implementar a cultura maker nas escolas está em estimular a autonomia, analise crítica, trabalho em equipe, liderança, comprometimento, ensinar a lidar com imprevistos e fazer a gestão do tempo, aponta Bruna Waitman, diretora do Media Education Lab. “Ainda é um movimento muito embrionário. Está chegando aos poucos. Essa coisa da cultura maker é complementar, então tem acontecido no contra turno. A maioria das escolas ainda não inclui o conceito no currículo. Quando acontece é algo extracurricular, opcional. Mas é um elemento relevante para desenvolver competências do futuro e aproxime as escolas do mundo real”, aponta Bruna.