Rosilene Samsel está prestes a realizar o sonho de se tornar historiadora. Nos últimos tempos, impressionada pelas aulas de história sobre a ditadura militar, ela debateu o tema com o professor, fez trabalhos em grupo e trocou ideias com os colegas de turma. Tudo via internet: o encontro com o tutor foi em um fórum online, os livros foram baixados de uma biblioteca digital e as discussões aconteceram em salas virtuais. A jovem estuda em um curso a distância no Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), que já formou mais de cem mil alunos e abrigava, no primeiro semestre de 2015, pelo menos 180 mil.
Os cursos oferecidos pela UAB, gratuitos e com vagas preenchidas por meio de processo seletivo, são ofertados por universidades parceiras de todo o país. Além da aprendizagem a distância, os alunos têm atividades em um dos 650 polos presenciais distribuídos por todo o território nacional. Um desses é na cidade paranaense Engenheiro Beltrão, onde Rosilene mora. Nas atividades presenciais, vão para lá cidadãos de localidades como Quinta do Sol, Araruna, Peabiru e Barbosa Ferraz. Alguns pernoitam em hotéis, devido à dificuldade de voltar para casa. Mas é bem melhor do que terem de se deslocar para as grandes metrópoles — o que inviabilizaria os estudos de muitos. “A tecnologia está disseminando a educação para lugares distantes, qualificando pessoas sem que elas tenham de migrar para as capitais”, diz Maria Aparecida Madureira Chaves, coordenadora do Polo de Apoio Presencial de Engenheiro Beltrão.
Nossos cursos acontecem na plataforma de aprendizagem Moodle, onde estão à disposição ferramentas para webconferências e acesso a conteúdos de fontes confiáveis
O perfil da UAB varia a cada região. Em Engenheiro Beltrão, predominam os jovens. Na cidade de Sorriso (MT), por exemplo, onde há um polo ligado à Universidade Federal de Mato Grosso, os alunos costumam ser mais velhos, conta o coordenador do polo, Carlos Rinaldi. Conciliar estudo, família e trabalho, no entanto, é a rotina comum de todos.
Uma rotina bastante puxada para alguns. Como João da Silveira, da cidade de Santana (AP). Ele começa a estudar às 4h30 da madrugada, antes de sair para o trabalho. Na hora do almoço, usando a rede do trabalho, ele estuda mais meia hora e participa das atividades interativas. Na casa dele, a internet é lenta. “Empresto meu celular para um amigo, que baixa as aulas em um centro de compras que tem internet rápida. Aí, de casa, à noite, eu e minha esposa assistimos os vídeos”, diz.
Os cursos da UAB acontecem na plataforma de aprendizagem Moodle, onde estão à disposição ferramentas para webconferências e acesso a conteúdos de fontes confiáveis. “A comunicação e a troca de informações vão acontecendo, e a tecnologia nada mais é que um canal para um fim que está sendo atingido com sucesso: a educação”, avalia Maria Luisa Furlan Costa, coordenadora da UAB na Universidade Estadual de Maringá (UEM).
O agricultor José Barbosa, de 45 anos, usa a rede sem fio da fazenda do patrão, no interior de Minas Gerais: “Fico todos os dias pelo menos uma hora e meia a mais na fazenda, pra fazer as lições e estudar, tudo pelo celular”. Uma vez por semana ele vai até Teófilo Otoni, polo mais próximo de sua cidade, Itambacuri, para as aulas presenciais. “Ainda vou me tornar professor”, sonha.
O EAD tem melhorado os índices de desenvolvimento humano de cidades como Flor da Serra do Sul, município paranaense a 500 km de Curitiba. De acordo com a prefeitura, as notas dos alunos do ensino fundamental foram melhores nas últimas avaliações nacionais. Isso se explica pelo ganho de preparo dos professores, 80% formados em pedagogia pela UEM, instituição que integra a UAB. A prefeitura da cidade relatou outro ganho, na qualificação dos profissionais de cargos públicos e de empresas da região, gerando até mesmo aumento na produtividade. A presença de um polo UAB no município resultou, ainda, na necessidade de oferecer um meio de hospedagem para receber os estudantes das cidades vizinhas, de modo que o fluxo extra de visitantes tem movimentado hotéis, restaurantes e o comércio.
No entanto, a efetividade do Sistema UAB como política pública tem inquietado alguns educadores. A necessidade de revisão do modelo é apontada, por exemplo, pelo professor Eucidio Pimenta Arruda, diretor de Inovação e Metodologia de Ensino e coordenador do Sistema Universidade Aberta do Brasil da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Ele considera que “o efetivo desenvolver do Sistema UAB e, marcadamente, o seu atual modelo de gestão, foram contraproducentes aos ideais de consolidação e institucionalização de um qualificado sistema nacional público de ensino a distância”.
Entre as mudanças que entende como urgentes, Arruda indica a criação de um modelo de custeio que fomente particularidades regionais, institucionais e acadêmicas; a contratação de docentes e servidores técnico-administrativos para as instituições parceiras; e a consolidação de um plano nacional para o ensino a distância. Esse plano, defende o educador, deve ser “amplamente discutido com a sociedade, com as instituições públicas de ensino superior e com todas as instâncias educacionais correlatas, devidamente conectado ao Plano Nacional de Educação e às demais diretrizes das políticas públicas educacionais”.
Universidade Aberta do Brasil (UAB)
Instituição pública
Mantenedor: Ministério da Educação (MEC)
http://uab.capes.gov.br
Aqui, todas as reportagens do Anuário ARede 2015 – Boas práticas do uso de TICs no ensino superior