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No Centro de Informática, alunos de diversos cursos se juntam para desenvolver projetos criativos

Guilherme é um garoto com Transtorno de Espectro Austista (TEA) que, como todas as crianças, de vez em quando precisa cortar o cabelo. A prática aparentementre é corriqueira, mas, da última vez, o menino não reagiu bem a essa atividade. Para criar a previsibilidade, tão importante a indivíduos com TEA, a mãe de Guilherme, Marta, baixou algumas fotos de cortes de cabelo da internet no celular e fotografou também o salão ao ldo da sua casa. Com esses conteúdos, começou a criar uma história usando um aplicativo chamado Conte. Depois enviou a história para a aprovação de Cecília, terapeuta de Guilherme. Com o ok da terapeuta, Marta mostrou a história ao filho antes de ir à cabeleireira e, dessa vez, ele aceitou ir cortar o cabelo de forma mais tranquila.

Marta, Guilherme e Cecília são nomes fictícios, mas o Conte, aplicativo que facilita a criação de histórias sociais para portadores de TEA, com a possibilidade de envio para validação profissional, download e compartilhamento de acervo online, está prontinho para ir ao mercado. Foi desenvolvido no semestre passado por um grupo de 11 alunos dos cursos de Informática, Design e Psicologia da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), estudantes da disciplina Projeto de Desenvolvimento do Centro de Informática (CIn), conhecida como Projetão. Em fevereiro, junto com mais cinco projetos desenvolvidos por outros alunos da disciplina, o Conte foi apresentado a um seleto grupo de CEOs do Porto Digital, de Recife. Acabou levando o prêmio UFPE-SoftexRecife Startup Demo Day e está agora à espera de um mentor, conta Aline Tenória, estudante de design e integrante do time que desenvolveu o Conte.

portal-arede-educa-Celeiro-de-ideias-uteis-e-viaveis-02Não é de hoje que os artefatos digitais criados pelos alunos que optam pela disciplina ganham destaque. Idealizado há dez anos, o Projetão é um verdadeiro celeiro de soluções, na avaliação do professor Luciano Meira, do Departamento de Psicologia, área que passou a integrar a disciplina em 2014. No último semestre, ao lado do Conte, surgiram o NewComers, aplicativo que coloca em rede turistas interessados em dicas fornecidas por pessoas da comunidade visitada; o Infila, para diminuir o tempo de espera em consultórios médicos; o Artcase, que conecta artesãos e compradores em uma rede criativa e intuitiva; e o CicleView, dispositivo com câmera traseira e alertas sonoros que possibilita ao cliclista ver no celular, acoplado ao guidão, o que acontece ao seu redor.

Em 2015, 80 alunos estão matriculados na disciplina, que começou dirigida a estudantes de sistemas de informação, por iniciativa do professor Cristiano Araújo, do CIn, e avançou com a chegada do professor Geber Ramalho, também do CIn, que trouxe os alunos de engenharia de software. Hoje, recebe alunos dos departamentos de design, liderados pelo professor André Neves, e de psicologia, do professor Meira. “Todos os times têm de ter alunos dos três departamentos”, diz Meira. Mas o Projetão tem estudantes de outros cursos, como dança, engenharia, administração.

 Os artefatos digitais criados pelos alunos têm tradição, em dez anos de existência do Projetão. Alguns já estão no mercado 

Com duração de um semestre, o Projetão é uma experiência que envolve todas as etapas de resolução de um problema social. Os jovens devem conceber e construir uma solução de TI de potencial inovador para o mercado. Para isso, é preciso explorar o que está sendo feito de melhor no mundo e partir para uma coisa nova, mas útil. “Eles são convidados a observar a atividade humana em várias atividades, a registrar os obstáculos que as pessoas enfrentam em diferentes contextos, a pesquisar. Precisam convencer os professores de que o problema identificado na sociedade é relevante, resolvível e desejável por um público”, esclarece Meira.

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Os jovens devem conceber uma solução de potencial inovador —­ como o projeto Conte —, explorando o que está sendo feito de melhor no mundo

Outro aspecto importante é a interação entre os alunos. Com equipes tão grandes, é importante gerenciar as pessoas e a comunicação entre elas. “Isso significa que além dos aspectos técnicos do projeto os alunos desenvolvem importantes habilidades de soft skill — apresentação, comunicação, saber ouvir etc.”, diz o professor Araújo. Segundo ele, boa parte do conteúdo técnico necessário para executar o projeto não é ensinada na disciplina: “Ou eles trouxeram de outras disciplinas ou precisam aprender durante”. Ao se engajar no projeto do Conte, Aline acredita ter dado o primeiro passo para “pensar fora da caixa”. “Queria entender melhor o público, ter uma experiência prática. Enfrentamos várias dificuldades, como não saber se a criança não respondia bem aos testes iniciais porque não se interessava mesmo ou se a solução apresentada não era boa, mas o resultado final foi muito bom”, explica ela.

Usando métodos de psicologia e design para criar soluções de TI, o Projetão segue bem a vocação de contribuição da UFPE para o desenvolvimento tecnológico de Recife (PE). Foi a partir da implantação do CIn, onde o Projetão foi concebido, que surgiram projetos vitoriosos na cidade, como o C.E.S.A.R, um centro privado de inovação que utiliza engenharia avançada em tecnologias da informação e comunicação para solucionar problemas complexos para empresas, e o próprio Porto Digital, ambiente de empreendedorismo, inovação e negócios de tecnologias da informação e comunicação de Pernambuco, que reúne mais de 200 empresas. Local de origem de várias empresas que ali começaram como startups, o CIn tem hoje 90 professores doutores, 50 funcionários, 2 mil alunos, divididos entre cursos de graduação e pós-graduação.
Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)
Instituição pública
Mantenedor: Ministério da Educação (MEC)
www.ufpe.br

 

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