A ideia de criar um espaço hacker na cidade mineira de Janaúba surgiu quando alguns jovens se incomodaram com a carência de espaços de aprendizado e desenvolvimento de tecnologias na cidade. Em 2012, com a intenção de reunir essas pessoas, Thalis Antunes de Souza, graduando de Engenharia de Computação, e os colegas Camila Tejada Berloffa, Dávila, Patricia Ferreira Cruz e Felipe Túlio de Castro apresentaram a proposta de instalar um espaço hacker nos fundos da Faculdade de Ciências de Tecnologia de Montes Claros (Facit). Mas a instituição não aceitou.
Os jovens se graduaram e Thalis não desistiu: começou a promover eventos junto com os amigos, em que cada um ensinava aquilo que sabia voluntariamente. O 1º Circuito Ciência, Inovação e Tecnologia da Serra Geral, executado em parceria com o Colégio Premio, Polo de Inovação de Janaúba, prefeitura, Instituto Federal do Norte de Minas Gerais (IFNMG) e a Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia e Ensino Superior ocorreu durante a Semana Nacional de Ciências e Tecnologia de 2013.O público atingiu até 90 pessoas por dia, surpreendendo os organizadores e deixando evidente a demanda por esse tipo de conhecimento na região.
Fundado em 2013, o grupo de jovens janaubenses adotou, em 2014, o nome de Centro de Desenvolvimento Colaborativo de Coisas – CDC Minas UP do norte de Minas Gerais. UP se refere à localização geográfica da Janaúba, que está “na parte de cima” do estado. A turma do Minas UP promove encontros para discutir assuntos relacionados a software e hardware, com foco especialmente em open hardware e open source. Assim foram idealizados os eventos Sexta do aplicativo e Sábado da robótica, além de outros encontros e minicursos.
Diego Silva é vice-presidente do Minas UP. Na diretoria estão Thalis (presidente) e Thiago Antunes (secretário). O grupo tem diversos colaboradores. A definição de cargos hierárquicos parece não combinar com a ideia de um espaço comunitário e autogestionário, porém, Diego demonstra ter clareza de que um hackerspace pressupõe uma forma de organização livre e espontânea: “Vai quem quer, não é obrigatório. É diferente de uma aula, de uma escola, onde se precisa seguir uma grade de conteúdos curriculares”. Cada um fica responsável por alguma tarefa. Enquanto um faz registros fotográficos, outro escreve conteúdos, outro atualiza postagens e faz divulgação. Apesar dos cargos definidos, parece não haver uma hierarquia de gestão no qual um manda e outros executam. Eles trabalham juntos.
Há grande preocupação em postar informações e conteúdos sobre tudo que é feito e produzido. Isso permite acesso a uma gama de conteúdos que ficam hospedados na plataforma RobôLivre. Além de dicas sobre robótica e temas afins, é possível navegar por imagens e materiais gerados nos minicursos, nas oficinas e em outros eventos que a turma promove, vários em parceria com o IFNMG, com a Universidade Aberta e Integrada de Minas Gerais e com a Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri.
O Minas UP se integra com as atividades econômicas dos seus organizadores. Diego diz que o hackerspace “é um hobby para trabalho, porque é divertido, é gostoso, mas tem as responsabilidades, afinal se trabalha com conhecimento e com pessoas”. Ele entende que ali não se trabalha com objetos tecnológicos, mas com gente. E isso gera muito aprendizado, além de uma rede de relações pessoais e profissionais bastante promissoras.
Eles vão a empresas de informática ou que trabalham com assistência técnica de celulares, câmeras e afins e se oferecem para receber o chamado lixo tecnológico desses lugares, ao mesmo tempo em que divulgam as atividades que realizam no hackerspace. O material recebido serve para realizar os encontros e as oficinas que contemplam pessoas de diferentes idades e interesses. Todas as atividades são gratuitas. Ao todo, são cerca de 23 integrantes frequentes, sendo que entre 10 e 15 desses participam assiduamente do Minas UP.
Os interesses também são bem variados. A primeira reunião do ano de 2015 foi iniciada com uma confraternização, no qual cada um dos presentes foi perguntado sobre o que gostaria de aprender. Uns querem aprender a fazer jogos, outros querem fazer robô, outros querem automatizar o próprio quarto ou a residência. Ao colocar tudo isso em uma lista, como fizerem, perceberam o caráter misto do Minas UP, o quanto é aberto e o quanto isso enriquece o hackerspace.
O começo de tudo foi uma espécie de teste “para ver se a coisas funcionavam”. Hoje os coordenadores afirmam que está valendo todo o esforço. Eles não fazem muita divulgação, pois estão tentando organizar a infraestrutura para receber mais pessoas e, depois disso, começar a fazer divulgação em rádios e escolas.
A infraestrutura do CDC Minas UP era dispersa em três locais. Atualmente, estão em uma sede provisória, mas bem espaçosa, com 2 mil metros quadrados compartilhados com a Coleta Seletiva, um grande parceiro no trabalho com lixo eletrônico.
As ações continuam desenvolvidas de modo voluntário e sem fins lucrativos, incluindo palestras a alunos de cursos técnicos como Pronatec, IFNMG, estudantes universitários, e para crianças de escolas publicas e de comunidades (por meio de parceria com a Polícia de Meio ambiente e o Codema). De segunda a sexta o espaço fica aberto com as atividades do Projeto Caxinguelê, para recebimento e tratamento de lixo eletrônico e disponível para a comunidade aproveitar e usar o que quiser e fazer seus projetos.
O 2º Cintec realizado pelo Minas UP teve como parceiro o IFNMG, que ofereceu um contêiner-laboratório e uma carreta com vários computadores. O contêiner foi colocado na praça principal da cidade de Janaúba. O Instituto abriu um espaço para que o grupo pudesse fazer inscrições para minicursos sobre temas como robótica nas escolas públicas, Arduíno, Scratch e outros temas não relacionados à informática,como saúde financeira, administração.
Thalis, que fora coordenador da área de tecnologias da prefeitura, convidou os técnicos de lá a atuar como voluntários nos minicursos que seriam planejados com base em temas de conhecimento e interesse deles próprios, ou seja, foram convidados a ensinar o que sabiam. Assim foi montada uma lista de cursos que ocorreram na carreta e no contêiner, gratuitamente. A participação da comunidade excedeu as expectativas, às vezes mal cabiam todas as pessoas interessadas. A divulgação do CDC Minas UP foi feita a partir dessas ações, por boca a boca com a comunidade presente nos minicursos.
A turma almeja que a comunidade do hackerspace cresça cada vez mais, compartilhando informações e colaborando com o conhecimento do outro. “Essa é a ideia do Minas UP: eu não sei fazer, mas vou aprendendo e ensinando. O bacana está sendo um ajudar o outro”, reafirma Diego, o tempo todo.